Foram aproximadamente 1500km em 13 dias de pedal. Enfrentei 10 montanhas e pude desfrutar das belíssimas paisagens dos Alpes.
Primeiramente deixo aqui o link que explica o motivo da viagem e mostra todo o planejamento, incluindo o trajeto
http://pedalandosemfronteiras.blogspot.com.br/2011/10/projeto-alpes-franceses.html
Depois deixo o link das 1163 fotos que tirei
Abaixo segue o vídeo de 70 min que fiz mostrando como foi essa grande aventura
Relato
12º Dia – Chamonix – Saint Rémy de Maurienne
13º Dia – Saint Rémy de Maurienne – Allemond
14º Dia – Allemond – Grenoble – Paris
Paranaguá – Curitiba – Zurique (07/07/12 – 09/07/12) – 99km
Durante a semana que antecedeu a aventura, o sol reinou soberano, mas na noite anterior a partida, a chuva começou. Que droga! O jeito foi enfrentar o mau tempo.
Acordei cedo, tomei um belo café da manhã e fui para a estrada. Senti um pouco de frio no início, mas logo cheguei na subida da serra e comecei a suar. Como estava carregado, 35 kg de peso (bike + bagagem), fui bem devagar. Minha velocidade estava na casa dos 6 km/h, mas meu ânimo era inversamente proporcional, mesmo tendo que enfrentar uma forte neblina no meio da serra.
Subi, subi, subi e exatamente ao meio dia cheguei no pedágio de Curitiba. Parei no SAU (Serviço de atendimento ao usuário), tomei um café e segui os últimos quilômetros até a casa dos meus amigos (Lucas, Leandro, Eni e Sebastião), onde pude lavar a bike, tomar um banho e prosear bastante.
No dia seguinte, sem chuva, fui à igreja da parte da manhã, almocei um belo strogonoff na casa do Leandro e da Carol e segui para o aeroporto. Foram poucos quilômetros pedalados neste dia, mas pude perceber que a corrente havia enferrujado com a chuva do dia anterior. Ao chegar no aeroporto, tratei logo de solucionar o problema e passei um óleo anti-ferrugem enquanto desmontava a bike. Fiz chek-in, esperei um pouco, peguei o avião e em pouco tempo estava no Rio de Janeiro, onde passei pelo controle de passaporte, esperei mais um tempo e embarquei rumo ao velho continente.
Foram quase 12h de vôo até Frankfurt, na Alemanha. Lá conheci um casal do Rio. Conversamos bastante enquanto passávamos pelo controle de imigração e pelo longo caminho até o portão A, onde fiz minha última conexão até Zurique.
A chegada em Zurique – 09/07/2012 – 27km
Enfim minha saga de vôos havia chego ao fim. A última aeronave pousou no horário previsto no aeroporto de Zurique. Coloquei a minha bagagem num canto e comecei a montar a bicicleta. Pneus, guidão, pedais e câmbio. Neste último, tive um pequeno problema com a gancheira torta. Problema que foi resolvido rapidamente com a substituição da peça. Regulei mal e porcamente as marchas, pois estava ansioso para pedalar no velho continente e com isso fiquei sem relação mais leve. Nada que atrapalhasse nos primeiros dias.
Com tudo pronto, respirei fundo, fiz uma oração e parti para a aventura. Daquele momento em diante, seriam aproximadamente 1500km em 14 dias. Pedalei poucos metros e entrei no posto de informações do aeroporto. Ali ganhei um pequeno mapa da cidade e uma explicação de como chegar ao centro. Agradeci e segui meu destino. As horas já passavam das 22 e o jeito foi pedalar de noite. Demorei um pouco para chegar na estação central, mas nada que diminuísse o meu ânimo, nem mesmo a chuva forte que me fez parar e esperar por uns 10 minutos.
Na estação, olhei meu guia de viagem e vi que havia um camping na cidade. Abri o mapa que ganhei no aeroporto, confirmei a localização do camping e segui. Não se passaram 5 minutos e lá estava eu novamente na estação, pois me perdi no caminho e resolvi voltar para o ponto de início. Perguntei para um guarda e o mesmo me indicou um hotel barato, mas que infelizmente estava fechado. Voltei para a estação e desta vez peguei uma boa explicação. Rodei, rodei e rodei, até encontrar a ciclovia paralela ao rio. Bingo! Segui um tempo pela ciclovia e cheguei no lago Zurique. Fui margeando o lago por uns 2 km e enfim avistei o camping. Olhei no relógio e as horas marcavam 2h da madrugada. Caramba!
No camping não havia ninguém para cadastrar a minha entrada, apenas dois homens estavam sentados na frente da lanchonete. Montei acampamento, comi algo e dormi.
Foram 27 km nesta brincadeira.
Zurique – Murg – 10/07/2012 – 100km
Acordei cedo, pois queria aproveitar a famosa cidade de Zurique. Ao sair da barraca, pude contemplar o sol, meio tímido, batendo nas águas azuis do lago. Que imagem! Fui até a beira do lago, sentei e fiquei olhando aquela bela paisagem. Depois de um bom tempo, voltei para a barraca, olhei o meu guia de viagem, peguei a bike e fui conhecer as principais atrações turísticas de Zurique.
Pedalei sempre à beira do lago e conheci as igrejas (Grossmünster e Fraumünter), o rio Limmat, o jardim chinês (infelizmente fechado) e algumas praças. Fiquei encantado pela cidade e pelo povo.
Quando retornei ao camping, decidi desmontar tudo e adiantar um pouco o meu roteiro. Digo adiantar, pois havia programado um dia inteiro em Zurique.
Acostumado com as leis brasileiras, fui para a autoestrada e um pouco antes de chegar nela, um senhor me avisou que não era possível. Achei estranho, mas segui o conselho e encontrei uma estrada alternativa, muito bonita, que beirava o lago.
Logo do início, havia muito sobe e desce. Então resolvi arriscar a autoestrada mesmo.
Perfeita! Tinha um acostamento grande e era plana, mas aos poucos notei que muitos motoristas estavam buzinando pra mim, tentando avisar da proibição. De repente apareceu a polícia. Que M….! Dei uma de “João sem braço” e eles só me deram um bronca. Depois fizeram com que eu pulasse uma cerca e seguisse para a estrada alternativa novamente.
Felizmente as oscilações da pista sumiram e aos poucos fui percebendo que ali era o melhor caminho mesmo, pois existia uma ciclofaixa gigantesca.
Passei por diversas vilas, me perdi algumas vezes e quando me dei conta, já estava beirando outro lago, o Lachen. Foi então que a ciclofaixa ficou paralela a autoestrada, mas sempre ficava alternando os lados (direito e esquerdo). Confesso que em alguns momentos fiquei meio confuso, sem saber para qual lado ir, mas do final tudo deu certo.
Por falar em final, ele foi espetacular. Pedalei por dentro de um pequeno parque, passei por túneis específicos para ciclistas e tive a magnífica presença do lago Walen ao meu lado esquerdo. Show!
Meu destino foi a vila Murg, mais especificamente, o camping de mesmo nome. Montei acampamento, tomei um belo banho e novamente fui sentar a beira do lago. Um fim de tarde inesquecível, com um belo lago e montanhas escarpadas ao fundo.
Murg – Davos – 11/07/2012 – 110km
Meu terceiro dia de pedalada na Suíça começou bem tranquilo, sempre em uma ciclovia que beirava o lago Walen até chegar na cidade de Walenstadd, onde fiz uma pequena pausa para comprar pães e bolachas.
Depois segui para as vilas de Flums, Sargan e Bad Ragaz. No caminho me perdi rapidamente, mas parei em um posto de gasolina, perguntei e no final das contas ganhei outro mapa. Segui exatamente o que me disseram no posto: Ir até Landquart e depois virar para a esquerda, sentido Schiers. Deu tudo certo. Passei por lugares bonitos, com diversas árvores e alguns rios.
Depois de Schiers, começaram a aparecer pequenas subidas e nesta hora eu estava pedalando numa ciclovia ao lado da autoestrada 28. Na verdade não era uma autoestrada, mas havia a proibição para ciclistas.
Eu estava ciente de que subidas fortes viriam e quando vi uma placa, sentido Davos, apontando para uma montanha, não tive dúvidas e fui enfrentar o aclive. Pedalei 3km bem pesados (lembrando que não regulei direito as marchas e não conseguia usar a mais leve), parei para descansar e ao ver uma mulher, perguntei se esse era o caminho certo. Descobri que não era. Que M…! Voltei ao “pé” da montanha, olhei a maldita placa novamente e ela estava errada mesmo. Perdi preciosos minutos nessa brincadeira.
Minutos depois apareceu uma bifurcação e logicamente que fiquei indeciso. Pensei um pouco e resolvi seguir o caminho que me parecia o correto. Pedalei um pouco e fui parar na frente de um pequeno córrego. Puts, errei o trajeto novamente! Esse foi o meu pensamento. Voltei na bifurcação, segui a minha segunda opção, que consistia de uma pequena subida e fiquei sem saida ao me deparar com o fim da estrada e uma montanha.
Soltei um alto e bom grito de raiva: Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!
Eis a subida que não me levou a nenhum lugar.
Pela terceira vez tive que passar pela bifurcação e logo cheguei no córrego que me fez voltar. Estava com tanta raiva que nem tirei a sapatilha para atravessá-lo. Com o pé molhado segui em frente e logo estava em Serneus, onde encontrei alguns jovens e me informei sobre o caminho que deveria seguir.
O córrego que atravessei está do lado direito da foto.
Mais calmo, pude apreciar melhor as paisagens e tirei várias fotos dos lugares pelos quais a ciclovia me levava. Fotografei inclusive a estrada principal que passava acima da vila de Serneus. Um belo local, tão belo que nem percebi a distância passar e quando me dei conta já estava em outra vila: Kloster-Dorf.
Em Kloster-Dorf começaram as subidas. Primeiro um aclive bem forte, mas curto, que me levou para Kloster-Platz e depois uma subida com jeito de serra mesmo, com direito a rodovia e não mais ciclovia. Foram 7km montanha acima, com diversas paradas para descanso, pois as energias já estavam no fim.
Depois de muito esforço, terminei a escalada e comecei a descer. Percorri 3km até avistar a cidade de Davos e o lago de mesmo nome. Fantástico! Registrei o momento e segui para o centro da cidade. Perguntei por um camping e fui avisado que o mesmo estava a 10km. Resolvi verificar, mas antes perguntei o preço dos hotéis. Infelizmente o único, que não estava lotado, custava aproximadamente R$ 140,00. O jeito foi seguir para o acampamento. Percorri os supostos dez quilômetros e não encontrei nada. Perguntei para algumas pessoas paradas na beira da estrada e me informaram que a distância era maior. Que M…! Pensei, analisei o trajeto do dia seguinte, que seria bem pesado, calculei rapidamente a minha situação financeira e decidi pelo hotel. O ruim foi voltar para a cidade, pois tive que enfrentar mais subidas.
Finalizei o dia com 110 km e muitos contratempos.
Davos (Suíça) – Trafoi(Itália) – 12/07/2012 – 104 km
Acordei cedo e fui saborear o café da manhã do hotel. Aproveitei para comer muito, pois sabia que o trajeto previsto para aquele dia (três montanhas) seria difícil. Comi 4 pães recheados com salame, queijo e geléia e tomei quase 1 litro de suco. Ufa!
Depois desse banquete, arrumei as minhas coisas, peguei a bike na garagem e comecei o pedal.
Ciente da situação, não me surpreendi quando vi a placa que indicava o Flüela Pass, ou seja, o primeiro passo de montanha que eu enfrentaria na viagem. Tirei uma foto e comecei a subir.
Foram quatorze quilômetros de muito esforço, mas a cada metro percorrido, ou a cada curva vencida, a natureza ficava mais exuberante, quase surreal. Primeiro pude apreciar muitas árvores pelo caminho, depois vi ao vivo as famosas vacas suíças e seus sinos. Neste momento, vieram em minha memória alguns comerciais dos melhores chocolates suíços. Confesso que fiquei com água na boca. Aos poucos voltei para a realidade do aclive e apertei o ritmo.
Quando estava na metade da montanha encontrei um cicloturista suíço chamado Oliver. Conversamos um pouco e nos despedimos. Logo comecei a visualizar cumes cobertos de neve e a emoção foi aumentando. Os últimos quilômetros foram os mais difíceis, mas proporcionalmente, os mais belos.
Por fim, depois de 2h, cheguei ao fim do passo Flüela, onde há um belíssimo lago e diversas montanhas nevadas. Show!
Registrei o momento, descansei um pouco, decidi que no final da tarde eu iria regular corretamente as marchas, coloquei roupas de frio e comecei a longa descida.
A paisagem continuou incrível e a estrada, assim como na subida, continha diversas curvas de 180 graus. Foram 14km de pura adrenalina até chegar na cidade de Susch, onde infelizmente a descida acaba. Em Susch, fiz uma pequena parada tirar algumas fotos e acabei encontrando outro cicloturista, dessa vez, alemão. Puxei conversa, mas confesso que não entendi uma palavra que o cara falou. Pedalamos juntos até Zernez, distante 6km de Susch, onde teve início a segunda montanha do dia e da aventura: Ofen Pass ou Pass Dal Fuorn.
Deixei a marcha bem leve e fui “escalando” a montanha. Aos poucos o alemão foi ficando para trás e depois que atravessei um túnel, nunca mais o vi. Subi durante 6km, e mesmo que nos últimos metros a inclinação tenha aumentado, eu estava feliz, pois além do visual fascinante que a subida me proporcionou, descobri que meu planejamento de 20 km de subidas estava errado. Comecei a rir sozinho.
Feliz da vida, desfrutei de outra descida alucinante, pena que ela durou apenas 4km, onde havia uma bifurcação na estrada: De um lado seguia para Livigno, Itália, e do outro continuaria o Ofen Pass. Não mudei o meu planejamento e peguei a segunda opção.
O trajeto foi espetacular, pois eu atravessei o parque nacional IL Fuorn. A estrada, praticamente plana, corta uma floresta incrível e a sensação é de estar fazendo uma trilha de MTB no asfalto. Pedalei assim durante alguns quilômetros e então tive que enfrentar mais um trecho de subidas.
Novamente troquei para a marcha leve e fiz muita força para vencer os últimos 4000m do passo.
Tirei fotos, descansei, comi algo e dá-lhe descer. O bom de pedalar nos Alpes é isso, sempre depois da subida do passo, vem a descida, diferentemente dos Andes, onde na maioria das vezes, existe o tal altiplano.
Foram 30 km descendo, isso mesmo, trinta qui-lô-me-tros. Curvas e mais curvas montanha abaixo. Passei pelas vilas de Santa Maria e Müstair. Nesta última fiz uma parada para descanso e aproveitei para comer pães e saborear um legítimo chocolate suíço. Que delícia!
Ao sair de Müstair, encontrei a divisa da Suíça com a Itália. Falei com os policiais e não precisei mostrar passaporte. Eu estava realizando o sonho de pedalar na Itália e não pensei duas vezes em registrar esta realização logo na primeira placa que apareceu. Confesso que fiquei uns 5 minutos tirando fotos e filmando.
Logo depois, passei por várias plantações com sistema de irrigação e os jatos de água deixaram a paisagem, que já era bonita, esplêndida. Conforme eu avançava, mais perto ficava do passo Stelvio, o mais temido e também mais bonito de toda a aventura. Não foram poucas as placas que indicavam o caminho para o passo, pois nele está situada uma das 20 estradas mais bonitas do mundo.
Passei pela entrada da vila de Glurms, virei para a direita e segui durante 9km com uma visão assustadora da montanha que eu iria subir. Ao terminar esses nove quilômetros, eu estava literalmente no início da montanha. Parei para pedir informações e para entrar em uma loja de souvenirs. Ao lado da loja encontrei 3 cicloturistas poloneses que me falaram sobre o meu último trecho do dia: A subida até Trafoi, que fica quase na metade do passo.
Disseram que Trafoi estava a aproximadamente 10km e que a inclinação não era tão forte. Os 10km eles acertaram, mas a inclinação, erraram feio.
No início foi fácil, mas logo depois “a porca torceu o rabo”. Não sei se era o cansaço de uma dia inteiro pedalando, ou a marcha que não estava totalmente regulada, indo somente até a segunda mais leve, ou até mesmo as duas opções juntas, mas sei que foi difícil. Muiiiiiiiiito difícil.
Forcei bastante até chegar em Gomagoi, onde pedi informações, descansei um pouco, comprei pães, salame e um chocolate que foi devorado em tempo recorde.
Ao continuar, pude apreciar as montanhas com cumes cobertos de neve e por alguns instantes esqueci todo o cansaço. Pena que foram só alguns instantes e logo voltei para a realidade da subida. Fazendo bastante esforço, consegui chegar na vila Trafoi. Não perdi tempo e logo estava instalado no camping que leva o mesmo nome da vila. Fiz questão de armar a barraca numa posição na qual eu pudesse ficar olhando para a gigantesca montanha coberta de neve.
Pedi para um motoqueiro, vizinho de acampamento, tirar uma foto, regulei as marchas, tomei um merecido banho, degustei os pães com salame e fiz questão de escrever o relato do dia olhando a paisagem.
Saldo do dia: 104 km de muito esforço.
Trafoi – Tirano – 13/07/2012 – 85 km
Chuva! Que droga.
Acordei pensando como seria pedalar em uma das estradas mais belas do mundo, mas minha empolgação não durou muito tempo, pois começou a chover. Resolvi dormir mais um pouco e quanto acordei, 1h depois, a chuva ainda teimava em cair.
O que fazer? Sair pedalando e correr o risco de não tirar fotos ou esperar que o tempo melhore?
Decidi esperar.
Desmontei acampamento, tomei meu café, escovei os dentes, olhei os mapas, olhei meu planejamento, escutei música, tive frio, depois calor e nada do tempo melhorar. Já cogitava em ficar esse dia de folga quando a chuva parou. Yes! Não perdi tempo e em menos de 5 minutos estava na estrada.
Foi então que comecei a entender o motivo daquela estrada ser considerada uma das 20 mais bonitas do MUNDO. Só estando lá para conferir. A cada curva eu ficava impressionado com o visual. É óbvio que a dificuldade foi diretamente proporcional à beleza do local. Ainda bem que no dia anterior eu tinha regulado as marchas e pude contar com a mais leve, pois a inclinação aumentou consideravelmente.
Subia um tanto, fazia um curva de aproximadamente 180º, subia novamente e outra meia volta. De repente apareceu um forte nevoeiro que cobriu totalmente a montanha e foi inevitável não pensar em Lipan, na Argentina, onde pedalei em duas oportunidades e nas duas tive a infelicidade do tempo estar fechado.
Continuei pedalando meio desanimado com a situação. Entretanto, para a minha alegria, o tempo mudou novamente e em poucos minutos o sol reinava imponente acima das montanhas cobertas de neve. Yes!
Com um sorriso na cara fui avançando e vencendo cada curva, cada quilômetro, cada inclinação. Novamente vou usar a frase do Antonio Olinto:
A subida era duríssima, mas maravilhosa. A estrada parecia uma serpente toda retorcida, espalhando-se de um lado a outro do penhasco, apegando-se nas menores oportunidades que o relevo oferecia para vencer o desnível.
Estaria mentindo se falasse que foi fácil, mas a magia daquele lugar compensou o esforço. Esforço que se intensificou nos últimos 5km. Eu olhei o caminho que deveria percorrer e quase não acreditei, porém fui seguindo.
Ao chegar no topo, 3h e 10 min depois, pude contemplar todo o caminho pelo qual havia passado. Um momento que vai ser difícil esquecer. Eu estava realizando um sonho: Subir o Passo Stelvio, na Itália, com aproximademente 2700m de altitude.
Tirei muitas fotos, fiz alguns vídeos, comprei alguns souvenirs e me preparei para a descida. Coloquei bastante roupa, pois o meu corpo esfriou e começara um princípio de neve.
Logo no início da descida, a adrenalina foi nas alturas. O primeiro motivo foi o visual fantástico daquelas montanhas e o segundo estava relacionado aos diversos nomes escritos na estrada. Ivan Basso, Cadel Evans, Purito Rodrigues, entre outros, ou seja, os melhores ciclistas do mundo estiveram ali. Foi no Giro d’Itália, que pude assistir pela televisão alguns meses antes. Novamente repito: Eu estava realizando um sonho.
Por ser uma realização pessoal, tentei aproveitar ao máximo aquele momento. Tirei fotos, filmei, parei para contemplar a imensidão dos Alpes e as curvas da estrada. Foram 15 km de magia até a cidade de Bormio, onde parei para comer uma maçã, olhar no mapa o trajeto a seguir e infelizmente dar adeus ao Passo Stelvio.
Saindo de Bormio descobri que não poderia seguir pela estrada principal e tive que pegar uma secundária. Pedalei tranquilamente, pois trânsito não havia. Subi um pouco, desci um pedaço e o resto foi plano. Passei por várias vilas e confesso que me perdi algumas vezes, mas nada que atrapalhasse muito. No fim, andei por uma ciclovia perfeita e atravessei plantações de maçã. Cheguei em Tirano as 19h, com 85km somados ao odômetro.
Ao entrar na cidade, me senti dentro do filme “Sabrina vai a Roma”, pois me deparei com aquelas ruas estreitas de paralelepípedos que dão acesso a uma praça. Na praça havia um albergue onde fiquei. Tomei um belo banho, usei o computador da recepção e fui conhecer a cidade. Show!
Eu não tinha programado um pernoite em Tirano, mas quis o destino (chuva durante a parte da manhã) que isso acontecesse e ele foi generoso comigo, pois a cidade é um charme. Muitas mulheres bonitas e bastante animação/movimento nas ruas. Aproveitei a ocasião para experimentar uma pizza italiana, mas não fez jus a fama. Na pizzaria encontrei um casal paulista que estava viajando de carro. Conversamos um pouco e nos despedimos. Andei mais um pouco pela cidade e quando uma garoa começou a cair, voltei para o albergue e dormi.
Tirano(Itália) – Lugano(Suíça) – 14/07/2012 – 145 km
Sabendo que o trajeto seria fácil, bem plano, acordei um pouco mais tarde, aproveitei o farto café da manhã do albergue e só fui para a estrada as 9h.
Demorei somente 3 horas para pedalar 70 km numa estrada bem movimentada e com poucos atrativos. O dia só começou a ficar interessante quando eu já estava próximo da cidade de Menaggio. Primeiro foi a adrenalina de atravessar alguns túneis, sendo que o maior tinha aproximadamente dois mil metros de extensão, depois foi a natureza em si, com seus lagos e montanhas.
Pedalei a beira do Lago di Como durante um bom tempo e passei por diversas cidades/vilas até chegar na maior delas: Menaggio. Ali percebi que o nível social aumentara, pois começaram a aparecer restaurantes chiques, carros de luxo, casarões e muita gente bonita. Fiquei tão focado no lugar que acabei errando a entrada para Lugano, meu destino do dia. Tive que voltar 2 km, para depois subir 2,5 km e por fim pedalar em uma rua bem estreita, parecida com a Av. Niemeyer (RJ).
Durante este último trecho eu deixei o primeiro lago para trás, entrei novamente na Suíça e contemplei o Lago di Lugano. Show!
Já na cidade destino, encontrei um senhor que me indicou um camping a 8 km do centro, na região metropolitana. Confesso que não foi tão fácil achar o tal camping, mas depois de algumas informações, consegui.
Armei acampamento, troquei a gancheira do bagageiro traseiro, que havia quebrado durante o pedal, tomei um banho e quando estava escrevendo o relato do dia dentro do aconchego da barraca, caiu um baita temporal. Nessa hora eu dei graças de ter levado uma capa de chuva (com menos de 1kg) para a barraca. Fica a dica.
Depois que o “dilúvio” passou, fui andar pelo camping e me surpreendi com a clientela. No local, que fica a beira do Lago di Lugano e ao lado do aeroporto, vi carros de luxo e barracas do tamanho de uma casa. Pelo jeito o pessoal passa todo o período de férias no camping.
Finalizei o dia me deliciando com pães e salame. Muiiito bom.
Lugano – Airolo – 15/07/2012 – 97 km
Acordei cedo, tomei meu modesto café da manhã (pães, salame e suco) e peguei a estrada. Pelo planejamento o dia não seria de belas paisagens, mas os últimos 35 km seriam de leve ascensão.
Pensei que iria me perder no início, mas não tive muitos problemas. Somente pedi informação duas vezes e pronto.
Fui avançado rapidamente até chegar na cidade de Rivera, onde fiz uma rápida pausa para comprar “gordices”. Comprei um chocolate suíço, um suco e uma bolacha de ovomaltine. Na mesma hora acabei com o chocolate e com o suco, guardando a bolacha para depois.
Ao continuar enfrentei uma pequena subida, 4 km de descida e outros tantos planos até a cidade de Bellinzona, onde pude ver placas do passo San Gottardo, a quarta montanha a ser enfrentada.
Aos poucos as subidas foram aparecendo, contudo ainda eram leves e eu conseguia pedalar a 15 km/h. Ao longe já podia visualizar as montanhas com neve, ou seja, no dia seguinte a diversão estaria garantida.
Faltando exatamente 35 km para o fim, a inclinação aumentou e minha média horária ficou abaixo dos 10 km/h. O jeito foi trocar para uma marcha mais leve e ter paciência. Fiz algumas curvas de 180º, passei por baixo da estrada principal, vi muitos ciclistas, inclusive famílias inteiras pedalando e parei para degustar a tal bolacha comprada no início do dia.
Este momento foi o melhor do dia, pois quando comi a primeira bolacha, descobri que meio sem saber havia comprado um “néctar dos deuses”. Bolacha de Ovomaltine, a melhor bolacha suíça. Pensei em comer o pacote inteiro, mas resolvi guardar um pouco para o fim do pedal.
Enfrentei mais algumas subidas e cheguei em Airolo as 15h e 20min. Procurei por camping, mas como não obtive sucesso resolvi ficar em uma pousada simples e barata para os padrões do país.
Tomei banho, saí para conhecer a pequena cidade, comi o resto do pacote de bolachas, voltei para a pousada, escrevi o relato, escutei músicas e dormi cedo, pois o dia seguinte seria muito, mas muito puxado.
Airolo – Interlaken – 16/07/2012 – 121 km
Consegui descansar bastante durante a noite e acordei disposto a enfrentar mais duas montanhas.
Durante o planejamento eu havia combinado de fazer a primeira montanha do dia, passo San Gottardo, junto com o Benno, um ciclista suíço, mas como não consegui ver o e-mail dele a tempo, acabei saindo bem cedo e nos desencontramos.
A subida do passo começou logo na saída da cidade de Airolo e confesso que no começo não estava difícil. Pedalei os primeiros quilômetros em uma marcha intermediária e avancei rapidamente. Aos poucos a subida foi ficando mais íngreme e fui obrigado a trocar para a marcha leve. De repente olhei para trás e me surpreendi ao ver, bem pequenina, a cidade de Airolo. Não imaginava que havia subido tanto.
O bom é que quanto mais alto, melhor a paisagem. Comecei a ver montanhas cobertas de neve, algumas cachoeiras pequenas e as sonoras vacas suíças com seus sinos.
Parei, fechei os olhos e por alguns segundos esqueci de tudo e de todos. De olhos fechados, apenas sentia o vento frio que fazia naquela manhã e ouvia os sinos das inúmeras vacas. Ao voltar para a realidade do aclive, percebi que faria uma curva bem fechada, onde a estrada parece acabar, entraria em um túnel e continuaria subindo em direção ao topo.
Percorri o caminho descrito acima e continuei subindo. Nesta hora o vento gelado dos Alpes me obrigou a fazer uma pequena pausa no pedal para colocar a camisa segunda pele. Aproveitei e tirei algumas fotos das montanhas nevadas.
Enfrentei mais alguns quilômetros de ascensão, entrei em outro túnel e finalmente cheguei ao fim do passo San Gottardo. Foram 16 km entre Airolo e o topo da montanha. Ufa!
Ali pude tirar belíssimas fotos de um outro caminho, chamado Tremola, em caracoles. Pena que eu não subi por ele, seria sensacional.
Um pouco mais à frente registrei a minha passagem pelo passo com uma foto ao lado da placa que indica a altitude, mas não fiquei muito tempo parado, pois o frio estava aumentando. Apenas coloquei o anorak e comecei a descida.
Foram 18 km de pura adrenalina na descida. Curvas fechadas, vento contra, vento lateral, montanhas para todos os lados e muito frio. Passei pela cidade de Andermatt e pensei que a descida havia acabado, contudo tive a feliz surpresa de despencar por mais alguns quilômetros até a cidade de Wassen.
Em Wassen fiz uma pequena parada para tirar as roupas de frio e iniciei a segunda montanha do dia: Passo Susten ou Sustenpass.
Logo no começo do passo percebi que seria bem mais difícil que o anterior, entretanto, todo esforço que fazia para vencer cada metro de desnível era recompensado com uma visão incrível das montanhas cobertas de neve, independente da direção que olhava.
Com certeza meus olhos estavam brilhando.
Demorei 3h para subir os 19 km do passo e em muitos momentos minha velocidade média não ultrapassava os 5 Km/h. Devagar pude apreciar aquela maravilha da natureza, mas confesso que nos últimos quilômetros eu estava exausto de tanto pedalar no aclive. Olhava para o caminho que faltava e desanimava, então mudava meu foco para a exuberância da natureza e ganhava novo ânimo.
Quando cheguei ao fim, estava com um baita sorriso. Filmei, fotografei e fui brincar na neve que estava bem ao lado. Aproveitei e escrevi meu nome na neve, ou seja, virei criança novamente
Aqui vale uma dica: Se por acaso pretende conhecer os Alpes Suíços, não deixe de passar pelo Sustenpass.
Novamente fiz o ritual de colocar roupas mais quentes para enfrentar a descida, comi algumas bolachas e segui.
Declives e mais declives, velocidades acima de 40 km/h e muita empolgação, afinal eu tinha completado as duas montanhas previstas para o dia e agora estava descendo em direção a cidade de Interlaken. Descida que durou aproximadamente 30 km, sendo 20 de inclinação forte e grandes velocidades.
Ao chegar na parte plana a rodovia ficou um pouco mais movimentada, entretanto bastou ficar atento e seguir durante míseros 9 km até Brienz.
Em Brienz há um lago com o mesmo nome da cidade. E que lago espetacular! Os suíços o chamam de “leite dos glaciares” e confesso que esse apelido não é exagerado, pois boa parte da neve derretida que desce das montanhas vai parar no lago.
Parei em um cais para poder visualizar melhor todo ambiente. Ali fiz uma longa filmagem do lago, da cidade, de um barco de passeio e de muitos turistas. Por fim, tirei aquela foto que já virou rotina quando estou a beira de lagos ou rios: Eu sentado e apreciando a paisagem.
Infelizmente não pude ficar muito tempo no cais, pois meu destino ainda estava a quase 20 km dali. Fui pedalando tranquilamente numa estrada muito bonita, sempre com o lago do meu lado esquerdo. Que beleza! Nem senti o tempo passar e quando me dei conta já estava na entrada da cidade de Interlaken. Olhei algumas placas e rapidamente vi o símbolo de um camping, segui o caminho indicado e logo encontrei o local.
Fui na recepção, paguei a minha estadia e quando estava armando minha barraca, um rapaz me chamou para jantar. Aceitei de imediato. Peat, o meu anfitrião, também era cicloturista e já havia pedalado no Brasil. Ele fez o trajeto entre São Paulo, Buenos Aires e Atacama, onde conheceu a sua esposa chilena Danfra. Na mesa pude falar português e espanhol, pois a Danfra e seu filho compreendiam tudo e depois traduziam para Peat e seus pais. Foi uma experiência sensacional. Esse é o espírito do cicloturismo. Adoro sair por aí, pedalando, conhecendo lugares novos e pessoas novas.
Agradeci muito o jantar, terminei de montar acampamento, tomei um banho e sai conhecer a cidade.
Interlaken está situada entre os lagos Thun e Brienz e tem vista para três famosos picos: Eiger, Mönch e Jungfrau. É uma cidade pequena de 5,5 mil habitantes, mas muito aconchegante. Andei pelas ruas, comprei souvenirs, tirei fotos dos três picos e aproveitei o momento. Foi “fantásticamente fantástico”.
Ao voltar para o camping a noite já caíra e tive que escrever o relato com ajuda da lanterna dianteira. Por fim, comi alguns pães com salame, escovei os dentes e dormi.
Saldo do dia: 121 km, dois passos de montanha e com direito ao lago Brienz e a bela cidade de Interlaken.
Interlaken – Berna – 17/07/2012 – 67 km
Um dia de pedal realmente curto e tranquilo.
Ao sair de Interlaken encontrei o lago Thun e boa parte do trajeto foi ao lado dele. Sempre com o lago à minha direita, passei pelas vilas de Spiez e Thun. Aproveitei e tirei muitas fotos da belíssima paisagem.
Depois de Thun, percorri mais 25 km planos até a cidade de Berna, capital do país, onde cheguei por volta das 12h. Fui seguindo algumas placas que indicavam um camping e em pouco tempo eu já estava com a minha casa ambulante montada.
Tudo aconteceu conforme o planejado, pois eu havia chego cedo em Berna e poderia conhecer melhor a capital. Deixei os meus pertences no camping e fui caminhando por uma “ciclovia” compartilhada que beirava o rio Aare. Este rio atravessa a cidade em forma de um “U” e é o melhor modo de um turista não ficar perdido.
Foram aproximadamente 3 km caminhando até chegar ao centro e depois andei mais ainda para conhecer tudo o que queria.
Primeiro conheci a torre do relógio, depois fui para a catedral e por fim o museu de Einstein, mas infelizmente este último estava fechado para reforma. Fiquei um pouco decepcionado, pois o museu foi, entre os anos de 1903 e 1905, a casa do grande mestre da Física e dali surgiu a teoria da relatividade. Pedi para um senhor tirar um foto minha na frente da casa/museu e por fim perambulei pelas ruas e lojas.
Voltei para o camping e tentei acessar a internet, mas não tive sucesso. Decidi retornar ao centro, desta vez pedalando, para ver meus e-mails e mandar notícias. OK.
Ao horas já ultrapassavam as 16 quando regressei ao aconchegante camping, tomei um banho, comi algo e fui descansar à beira do rio Aare.
Assim terminei o meu dia. Tive uma excelente estadia na capital Suíça. É uma cidade muito bela e organizada. Vale a pena conhecer.
Berna – Martigny – 18/07/2012 – 158 km
No dia anterior, enquanto escrevia o diário, decide que meu próximo destino seria a cidade de Martigny, que dista 40 km de Montreux, cidade planejada para o meu pernoite. Aumentei essa quilometragem pensando na subida que iria enfrentar logo depois de Martigny, pois assim eu iria subir logo no começo do dia e com certeza estaria com mais energia.
Pois bem, meu dia começou cedo. Exatamente as 7:30 me despedi da capital Suíça e percorri 35 km, com pequenas subidas, até a cidade de Friburg. A paisagem não teve nada de especial, apenas plantações.
Em Friburg escolhi um dos dois caminhos que seguiam para Bulle e acho que levei azar, pois as pequenas subidas continuaram. Novamente a estrada ficava a beira de inúmeras plantações de ambos os lados, mas quando eu estava bem próximo de Bulle, pude ver no horizonte as temidas montanhas, ou melhor, as divertidas montanhas.
Fiz uma parada logo que entrei na cidade. Comprei dois pacotes da bolacha de ovomaltine, um chocolate do mesmo sabor e uma coca cereja. Fiquei longos minutos descansando, pois o calor estava forte. Acho que foi o dia mais quente que enfrentei nessa aventura.
Ao sair de Bulle enfrentei 35 km até Vevey, cidade que fica ao lado de Montreux. As pequenas subidas marcaram presença nos primeiros 22 km, onde fica a cidade/villa de Chatel Sant-Dennis. Os 13 km restantes foram rapidamente percorridos em função de uma longa descida e no fim deste trecho pude contemplar a majestoso lago Leman. Que visão! As cidades de Vevey e Montreux, o lago Leman e ao fundo as montanhas nevadas. Impressionante!
Depois de tirar muitas fotos do lago e das cidades, continuei o meu trajeto pedalando por uma avenida paralela ao lago e muito movimentada. Fui avançado e em pouco tempo eu já estava no castelo de Chillón. Pensei em entrar para conhecer, mas achei que não valia a pena.
Devagar o lago Leman foi ficando para trás e as montanhas estavam cada vez mais perto, fazendo minha mente pensar que havia algum aclive antes de chegar em Martigny. Ela estava enganada, pois a última parte (40 km) foi totalmente plana.
Um pouco antes de chegar ao meu destino do dia, parei para comer as deliciosas bolachas e tive a desagradável surpresa de encontrar o recheio totalmente derretido. “Maldito” calor!
Depois bastou pedalar mais alguns míseros quilômetros e pronto. Em Martigny fiquei aproximadamente uma hora procurando um hotel barato. Andei o centro inteiro e no fim descobri que existia um camping. Não tive dúvidas ao escolher e rapidamente cheguei para mais um acampamento.
Tomei um banho, comprei pães, salame e frutas, escrevi o relato e dormi.
Martigny (Suíça) – Chamonix (França) – 19/07/2012 – 42 km
Novamente a estratégia de deixar uma subida longa para o período matutino se mostrou eficaz.
Ao sair de Martigny comecei a enfrentar a última montanha em território suíço: Col du Forclaz, com 16 km.
No início foi até fácil para os padrões dos Alpes Suíços, mas aos poucos a inclinação foi aumentando e precisei fazer algumas pausas para recuperar o fôlego. Durante esses instantes de descanso eu aproveitava para tirar fotos da paisagem, inclusive da cidade da Martigny, que já estava alguns metros abaixo.
Aos poucos fui avançando e quando restava apenas 1km para o topo, um convidado indesejado apareceu: O vento contra.
Subida e vento contra, uma combinação terrível.
Tive que fazer muita força para completar este último trecho do Col du Forclaz, mas venci mais uma montanha Alpina.
Tirei algumas fotos da placa que indica o fim do aclive, fiz um pequeno vídeo para mostrar a intensidade do vento e comecei a descer.
Durante a descida pude ver um gigantesco glaciar e fiquei pensando como seria chegar em Chamonix e avistar o Mont Blanc, o monte mais alto da Europa.
Infelizmente a descida durou menos de 10km e logo comecei a subir novamente. Sinceramente eu não lembrava de ter visto no planejamento esta subida, mas a única coisa a se fazer era continuar pedalando. A “tristeza” de enfrentar outro aclive entrou em choque com a alegria de ver a divisa entre a Suíça e a França. Pedalando a uns 10km/h passei pela guarita vazia e oficialmente estava em terras francesas. Que beleza! Novos costumes, culturas, pessoas, idioma, etc. Assim pensei e depois dei um grito: VIVE LA FRANCE!
Por fim contei mentalmente os países pelos quais já pedalei: Brasil, Argentina, Paraguai, Chile, Suíça, Itália e agora estava na França. E se tudo der certo, vou pedalar por muitos outros.
Pois bem, depois de entrar na França e comemorar sozinho, voltei para a realidade da subida, que para a minha felicidade não foi extensa e nem tão difícil. Com aproximadamente 10km percorridos eu já estava no topo e podia apreciar o visual das montanhas cobertas de gelo ao fundo. Uma delas era a famosa Aiguille du Midi que eu tinha visto no planejamento, sinal que Chamonix estava bem próxima.
Novamente fiz o registro fotográfico da placa que indicava o topo da subida, Col des Montets e comecei a descer rumo ao destino do dia.
Desci, desci, desci, passei pela vila de Argentière e continuei descendo. O visual era fantástico. As montanhas escarpadas e cobertas de gelo em seus cumes são uma atração e tanto. Quase no final do declive fiz uma parada para tirar fotos, mas infelizmente elas não saíram do jeito que eu esperava. Depois bastou despencar mais alguns míseros quilômetros e chegar em Le Praz (fala-se Le Prê), uma vila muita próxima a cidade de Chamonix.
Em Le Praz encontrei um camping perfeito. Conversei, paguei e fui orientado a montar minha barraca e um local incrível. Com vista para a montanha Aiguille du Midi e se o tempo ajudasse eu poderia ver uma pontinha do Mont Blanc. Será que eu estava feliz?
Essa era a vista que eu tinha da minha barraca
Foram apenas 42km de pedalada e por isso cheguei cedo, exatamente as 12:30h. Tive tempo de tomar um banho, comer algo, pegar informações no camping, tentar entrar na internet (muito lenta) e só depois sai caminhando para o centro de Chamonix.
Andei aproximadamente 3km até ter o prazer de tirar uma foto da placa que indicava entrada da cidade e sem perder muito tempo fui seguindo para a maior atração do local: O teleférico que sobe na Aiguille du Midi, onde se pode apreciar o Mont Blanc e diversas outras montanhas.
Passei ao lado da estação de trem, por um supermercado e quando cheguei ao teleférico, descobri que o mesmo estava fechado por causa do vento. Puts, que merda! Perguntei se havia uma previsão e a resposta foi desanimadora: Provavelmente só no dia seguinte. Outra vez, me merda!
O jeito foi conhecer o centro da cidade e depois subir no teleférico mais simples, que fica na montanha do lado oposto do Mont Blanc.
Andei, entrei em diversas lojas e apreciei bastante o centro. Confesso que tive uma boa impressão da cidade. Achei bem aconchegante e simpática.
Depois fui para o outro teleférico e mesmo de longe, fiquei deslumbrado com a vista. Olhava para frente e via diversas montanhas com neve, aos meus pés estava a charmosa cidade de Chamonix e atrás existiam outras montanhas cobertas, pelas vegetação, e um lago. Impressionante!
Registrei o momento e depois fiquei alguns minutos em silêncio, fazendo uma pequena oração de agradecimento.
Infelizmente, daquele local eu não pude ver o Mont Blanc, mas já havia decidido levantar cedo no dia seguinte e talvez realizar o sonho de ver a famosa montanha.
Voltei para o camping com uma mistura de sensações, comprei uma pizza de um vendedor ambulante, igual aos nossos carrinhos de cachorro quente, tomei outro banho e fui dormir sonhando com o ponto mais alto da Europa.
Chamonix – Saint Rémy de Maurienne – 20/07/2012 – 123 km
Acordei ansioso para ver o Mont Blanc. Tomei o meu “café”, ajeitei algumas coisas no bagageiro da bicicleta, principalmente roupas de frio, pedalei até o teleférico e ainda tive que esperar durante uns 30 minutos para que os serviços começassem a funcionar.
Enquanto esperava, decidi ir até a praça central e conferir as estátuas de Jacques Balmat abraçando Horace Bénedict de Saussure e apontando que aponta diretamente para o cume do Mont Blanc.
Aqui vale ler um pouco da história:
A saga da conquista do Mont Blanc iniciou-se em 1760, quando o filósofo e naturalista suíço Horace Bénedict de Saussure, natural de Genève, mas um apaixonado por Chamonix, ofereceu um prêmio em dinheiro para quem encontrasse uma rota viável até o cume da montanha, a mais alta dos Alpes. Saussure tinha por objetivo fazer medições científicas no cume da montanha. Várias tentativas foram feitas, sendo que, em uma delas, até se ganhou certa altura, mas os ousados aventureiros voltaram, porque a ascensão deveria ser feita em apenas um dia. “As pessoas não acreditavam que fosse possível aventurar-se a passar a noite naquelas neves”, teriam dito a Saussure. Finalmente, às 18h23 do dia 8 de agosto de 1786, os franceses Jacques Balmat e Michel Gabriel Paccard, ambos naturais de Chamonix, pisaram o cume da montanha. Paccard, 21 anos, era médico de família rica, enquanto que Balmat, 34, tinha origem humilde, era guia de montanha e caçador de cristais nos Alpes.
http://www.companhiadaescalada.com.br/artigos/historia/historia01.htm
Registrei o momento ao lado das famosas estátuas e voltei para o teleférico. Exatamente às 7h da manhã subi a primeira parte, chamada Plan di Aiguille.
Novamente eu podia olhar a charmosa Chamonix do alto, mas meus olhos queriam ver a deslumbrante montanha. Diferentemente do dia anterior, no qual eu olhava a montanha de longe, agora eu fazia parte da mesma. Tirei muitas fotos, filmei e apreciei ao máximo aquele momento, mas ainda estava faltando ver o Mont Blanc. E para realizar o grande sonho, tive que esperar mais um pouco até o vento diminuir e o teleférico principal funcionar.
Neste momento eu já havia colocado todas as roupas de frio que estavam na sacola, e quando cheguei ao topo do Aiguille du Midi, quase congelei com o vento frio. Só senti um vento tão gelado assim na Patagônia. E foi assim, com muito frio, que conheci o Mont Blanc, a montanha mais alta da Europa, com 4810 m de altitude. Que emoção! O vento batia, a mão “congelava”, o corpo tremia, o ouvido doía, mas mesmo assim fiquei firme e forte para tirar fotos e filmar bastante. Ao olhar para baixo, vi pessoas escalando de um lado e um glaciar do outro. Sensacional! Depois de muito tempo aproveitando aquela maravilha da natureza, voltei para o complexo do teleférico e ainda tive a surpresa de encontrar um museu de escalada. Show!
Satisfeito, desci novamente até a cidade de Chamonix, passei em um supermercado e por fim, voltei ao camping por volta das 10h. Comi, arrumei minhas tralhas e sai às 11h e 17 min.
Meu destino era incerto, pois no planejamento estava marcada uma distância de aproximadamente 130 km até Saint Rémy de Maurienne e saindo tão tarde assim eu não tinha certeza que completaria o percurso.
Para minha felicidade os primeiros 15 km foram de descida e como eu não encontrei outra opção, tive que pedalar na autoestrada mesmo. Avançava e esperava a polícia, mas desta vez quem apareceu foi o pessoal que cuida da autoestrada. Eu expliquei a situação, eles me alertaram sobre a proibição e enfim me indicaram o caminho certo, que passava por Servoz e Passy.
Agradeci, usei a palavra errada para pedir desculpas, mas acho que eles entenderam e segui. Enfrentei um pequeno sobe e desce numa estradinha muito bonita e por fim desci muito até bem próximo de Passy. Depois enfrentei uma boa subida de aproximadamente 10km, onde fiz uma parada que comer as bolachas compradas em Chamonix e descobri que sem querer eu havia comprado a melhor bolacha francesa, na minha opinião é claro. A bolacha era igual a Tortinhas, mas o recheio era com “gelatina” de framboesa. Uma delícia. Guardei alguas e continuei subindo até Megeve, onde enfim cheguei no longo trecho com declive.
Sem fazer muito esforço eu avancei bastante e quando vi já estava na cidade de Ugine, onde virei para a esquerda e segui por uma marginal, com 10km planos, até Albertville.
Em Albertville fiz uma pequena parada para terminar de comer as bolachas de framboesa e também decidi comprar um novo mapa, pois o mapa que ganhei na Suíça mostrava somente até Ugine.
Com o novo mapa em mãos foi bem fácil encontrar o caminho até Aiguibelle, cidade que naquele momento e horário parecia ser a melhor opção para completar o dia.
O caminho continuou plano, mas a paisagem surpreendeu bastante. Muitas plantações em ambos os lados faziam a distância parecer menor, entretanto a melhor parte estava por vir. De repente eu atravesso uma pequena vila e ao olhar o muro das casas, percebi que ele não se feito de concreto ou madeira, mas sim de pequenos arbustos parecidos com parreirais. Esta cena aparentemente simples e boba fez minha mente lembrar de quando eu era criança/adolescente e gostava de jogar Top Gear no Super Nintendo. Neste jogo de corrida existia uma pista, na França, que era exatamente igual ao que eu estava vendo. Essa lembrança fez com que eu pedalasse os últimos cinco mil metros dessa estrada cantando a melodia do jogo.
Infelizmente a música parou quando virei novamente para a esquerda, em direção a Aiguibelle, que não demorou a aparecer. Na cidade fui procurar um hotel, mas como estava muito caro resolvi perguntar se havia um camping e me indicaram um local que estaria a míseros 7km. Olhei para o céu, vi as nuvens de chuva chegando e pedalei o mais rápido possível, mas ao completar a distância informada, descobri que ainda faltavam 10km para o tal camping. Que M…! Até hoje não sei se me informaram errado ou eu entendi apenas o seven do seventeen.
Forcei novamente, mas mesmo com o vento e a estrada plana me ajudando, não consegui chegar antes da chuva. Tive que pedalar os últimos metros debaixo de um verdadeiro toró e quando vi, estava na cidade de Saint Rémy de Maurienne, ou seja, completei o trajeto previsto no planejamento.
Montei acampamento, lanchei um belo sanduíche na cantina do camping e fui dormir com a certeza do dever cumprido.
Saint Rémy de Maurienne – Allemond – 21/07/2012 – 59 km
Durante a noite a chuva parou e ao acordar pude ver as montanhas ao redor. Por falar em montanhas, eu teria que enfrentar mais um aclive gigantesco para chegar em Allemond, chamado Col du Glandon.
Desmontei acampamento e percorri apenas 6km até Saint Ettiene de Cuines, onde oficialmente começa a escalada. Logo no início avistei uma placa que indicava a quilometragem, 19 km, o percentual de inclinação e a altitude. Tudo isso com a logomarca do Tour de France. Fiquei feliz ao saber que estava pedalando por uma estrada do Tour, mas ao mesmo tempo fiquei preocupado com a intensidade da subida.
Troquei para a marcha mais leve e segui bem devagar. Muitos ciclistas estavam treinando e por inúmeras vezes recebi a palavra courage (coragem) como incentivo. Foram 8km com inclinações variando entre 6% e 7%, muitas curvas e vários desenhos/nomes na estrada, pois os melhores ciclistas de estrada do mundo tinham passado por ali 9 dias antes. Eu estava realizando mais um sonho : Pedalar por uma estrada do Tour.
Ao chegar na vila de Saint Colomban dês Villards a inclinação desapareceu e pude pedalar no plano por aproximadamente 1km, mas antes fiz uma parada estratégica em uma padaria para comer maçãs e bolachas.
Ao seguir, descobri que os últimos 10 km do Col du Glandon seriam terríveis. As inclinações voltaram e seus valores estavam no intervalo fechado de 7% e 11%. Nos últimos três quilômetros eu pedalava um trecho e parava para recuperar o fôlego. Fiz muita força para vencer esse desafio, mas mesmo exausto, pude apreciar a beleza ímpar daquele local. Isso não tem preço.
No topo descansei por longos minutos, tirei fotos da placa que indicava o fim do aclive, coloquei roupas de frio e comecei a descida.
Na descida fui surpreendido por um lago/represa chamado
Alpe d’Huez é uma das subidas mais famosas do Tour de France e obviamente também estava na minha lista de sonhos a serem realizados.
Rapidamente cheguei na vila e perguntei para um morador qual era a distância até o topo. A resposta foi a mais completa possível: Aproximadamente 3,5 km ou apenas 6 curvas.
Parei, tirei fotos, descansei e recuperei o fôlego para enfrentar a última subida da aventura.
Quando comecei a subir, descobri que seriam muitos difíceis as tais seis curvas. Novamente coloquei a marcha mais leve e fui avançando a míseros 5 km/h.
Devagar pude aproveitar cada metro daquele trecho, mas confesso que no final eu estava totalmente exausto.
Fotos e mais fotos, compras e mais compras no “templo” do Tour.
Havia chego a hora de partir e a nostalgia tomou conta do mim. Rapidamente fiz uma retrospectiva da aventura em minha mente e é claro que só pude tirar uma conclusão: Tudo valeu a pena.
Depois disso comecei a pensar como seria conhecer Paris e a “tristeza” do fim da viagem deu lugar a ansiedade de conhecer a cidade luz.
Comecei a descer a montanha.
Foram 15 km com muitas curvas até a vila/cidade de Le Bourg-d’Oisans. Ali tentei pegar um trem, mas infelizmente não obtive sucesso. No centro de informações fiquei sabendo que deveria ir até Grenoble e foi isso que fiz.
Pedalei mais cinquenta quilômetros, saindo dos Alpes, até a Gare (estação de trem) de Grenoble. Ali desmontei a bike e peguei um trem de alta velocidade (TGV) para Paris.
O trem demorou apenas 3h para percorrer aproximadamente 600 km e com isso eu cheguei na capital francesa antes de anoitecer.
Montei a bicicleta, peguei um mapa da cidade no posto de informação da Gare de Lyon e fui me aventurar pela cidade.
A primeira e única atração que fiz questão de conhecer naquele dia, foi a mundialmente famosa Torre Eiffel, mas para chegar até ela eu passei pelo Rio Sena e pela Catedral de Notre Dame. Tirei algumas fotos e logo cheguei à torre, um pouco depois de anoitecer.
Quando vi aquela maravilha da engenharia, toda iluminada, fiquei hipnotizado. Tentei tirar uma foto que enquadrasse a bicicleta e a torre, mas havia centenas de pessoas esperando para subir no monumento e a foto não ficaria boa.
Passado o transe hipnótico, tive que resolver o que fazer e decidi que iria procurar um local para dormir. Confesso que cogitei a possibilidade de montar acampamento no parque/jardim que fica ao lado da torre, mas logo percebi que a ideia era absurda. Depois pensei em procurar hotéis mais baratos nos arredores de onde eu estava. Hotel barato no centro de Paris? Outra ideia estapafúrdia. Foi então que lembrei do meu guia do viajante aventureiro. Encostei a bike, peguei o guia e finalmente achei o que procurava: Hotel d’Artagnan, rua Vitruve, número 80, diária de aproximadamente 27 euros.
Olhei no mapa e descobri que deveria atravessar “a cidade inteira” para chegar ao hotel. Pois bem, demorei mais de duas horas para percorrer todo o trajeto e é claro que me perdi infinitas vezes, mas enfim cheguei. Pelo menos eu conheci muitas partes da cidade e entendi o motivo do apelido de Cidade Luz. Paris a noite é fantástica.
Paguei a minha estadia, fui numa mercearia que felizmente estava aberta, tomei um belo banho e fui dormi a 1:30h da madrugada.
Acordei cedo e aproveitei bem o café da manhã que era a única refeição inclusa na diária do hotel. Foram 5 pães, 2 copos de suco e iogurte com aveia.
Em seguida voltei para o quarto, arrumei as coisas e saí às 9h. Caminhei todo o trajeto da noite anterior em exatamente uma hora e meia e então comecei a peregrinação às atrações turísticas.
Tirei fotos da Catedral de Notre Dame, do Rio Sena, da Saint Chapelle e fui para o Louvre. Enfrentei uma fila grande para adentrar no famoso museu e nessa fila conheci um grupo de brasileiros que fizeram um pedal, com guia, pela região do Mont Blanc. Combinamos de percorrer o museu juntos.
Dentro do Louvre nosso objetivo era conhecer a Monalisa, então não perdemos tempo e fomos a procura do Da Vinci mais conhecido. Tiramos muitas fotos dos quadros, das estátuas, das milhares de pessoas e enfim chegamos na tão sonhada imagem.
Confesso que sempre imaginei um quadro grande e descobri que a Monalisa é um quadro de tamanho normal. Fiquei um pouco desapontado.
Foi difícil tirar uma foto decente devido ao aglomerado de pessoas, contudo, com muita paciência, consegui pelo menos algumas fotos e um vídeo.
Posteriormente fomos para as exposições grega, egípcia e romana. Cansados e satisfeitos resolvemos sair.
Nos despedimos, trocamos e-mail e seguimos nossos caminhos.
Voltei caminhando até o albergue, tomei um banho, entrei na internet e por fim conversei com outros companheiros de quarto antes de dormir.
No dia seguinte, 24/07/2012, fiz o mesmo ritual antes de sair, ou seja, tomei um café reforçado, arrumei minhas coisas e fui passear. Desta vez decidi ir de metrô e gostei bastante da qualidade do serviço.
Já no centro, fui conhecer por dentro a Catedral de Notre Dame e a Saint Chapelle. Na primeira fiquei longos minutos rezando/agradecendo e confesso que ao sair estava bem emocionado.
Em seguida passei pelo Jardim das Tuileries, Obelisco, avenida
assim chamado em referência ao físico francês Jean Bernard Léon Foucault) que é uma experiência concebida para demonstrar a rotação da Terra em relação a um referencial.
Ao voltar para o albergue, o quarto estava sendo limpo e decidi ir caminhando até o cemitério onde estão enterrados Benjamin Constat, Jim Morrinon, Alan Kardek e muitos outros famosos, mas não tive paciência de procurar os túmulos.
Cansado, cheguei novamente no albergue e dormi bastante no período da tarde.
Meu penúltimo dia em Paris foi dedicado a conhecer o trajeto até o aeroporto. Tinha visto na internet que o caminho mais fácil era uma autoestrada e então procurei uma rota alternativa.
As 9h da manhã peguei minha bicicleta e fui seguindo o em direção ao aeroporto, mas me perdi bastante e decidi voltar. Novamente olhei na internet, gravei corretamente o caminho e decidi usar as bicicletas velib, que são bicicletas disponíveis para as pessoas, sendo que a primeira meia hora é grátis. Desta vez consegui chegar no aeroporto, onde tive minhas dúvidas esclarecidas e voltei. Acabei errando o caminho, mas encontrei outro.
No albergue, apenas deixei tudo pronto pra o dia seguinte e dormi.
Último dia em Paris.
Simplesmente arrumei as bagagens na bicicleta e fui para o aeroporto. Não errei o caminho desta vez.
Ao chegar, desmontei a bike, fiz check in e dei adeus ao meu tour pela Europa.
Relato
Paranaguá – Curitiba – Zurique (07/07/12 – 09/07/12) – 99km
Acordei cedo, tomei um belo café da manhã e fui para a estrada. Senti um pouco de frio no início, mas logo cheguei na subida da serra e comecei a suar. Como estava carregado, 35 kg de peso (bike + bagagem), fui bem devagar. Minha velocidade estava na casa dos 6 km/h, mas meu ânimo era inversamente proporcional, mesmo tendo que enfrentar uma forte neblina no meio da serra.
Subi, subi, subi e exatamente ao meio dia cheguei no pedágio de Curitiba. Parei no SAU (Serviço de atendimento ao usuário), tomei um café e segui os últimos quilômetros até a casa dos meus amigos (Lucas, Leandro, Eni e Sebastião), onde pude lavar a bike, tomar um banho e prosear bastante.
No dia seguinte, sem chuva, fui à igreja da parte da manhã, almocei um belo strogonoff na casa do Leandro e da Carol e segui para o aeroporto. Foram poucos quilômetros pedalados neste dia, mas pude perceber que a corrente havia enferrujado com a chuva do dia anterior. Ao chegar no aeroporto, tratei logo de solucionar o problema e passei um óleo anti-ferrugem enquanto desmontava a bike. Fiz chek-in, esperei um pouco, peguei o avião e em pouco tempo estava no Rio de Janeiro, onde passei pelo controle de passaporte, esperei mais um tempo e embarquei rumo ao velho continente.
Foram quase 12h de vôo até Frankfurt, na Alemanha. Lá conheci um casal do Rio. Conversamos bastante enquanto passávamos pelo controle de imigração e pelo longo caminho até o portão A, onde fiz minha última conexão até Zurique.
Com tudo pronto, respirei fundo, fiz uma oração e parti para a aventura. Daquele momento em diante, seriam aproximadamente 1500km em 14 dias. Pedalei poucos metros e entrei no posto de informações do aeroporto. Ali ganhei um pequeno mapa da cidade e uma explicação de como chegar ao centro. Agradeci e segui meu destino. As horas já passavam das 22 e o jeito foi pedalar de noite. Demorei um pouco para chegar na estação central, mas nada que diminuísse o meu ânimo, nem mesmo a chuva forte que me fez parar e esperar por uns 10 minutos.
Na estação, olhei meu guia de viagem e vi que havia um camping na cidade. Abri o mapa que ganhei no aeroporto, confirmei a localização do camping e segui. Não se passaram 5 minutos e lá estava eu novamente na estação, pois me perdi no caminho e resolvi voltar para o ponto de início. Perguntei para um guarda e o mesmo me indicou um hotel barato, mas que infelizmente estava fechado. Voltei para a estação e desta vez peguei uma boa explicação. Rodei, rodei e rodei, até encontrar a ciclovia paralela ao rio. Bingo! Segui um tempo pela ciclovia e cheguei no lago Zurique. Fui margeando o lago por uns 2 km e enfim avistei o camping. Olhei no relógio e as horas marcavam 2h da madrugada. Caramba!
No camping não havia ninguém para cadastrar a minha entrada, apenas dois homens estavam sentados na frente da lanchonete. Montei acampamento, comi algo e dormi.
Foram 27 km nesta brincadeira.
Perfeita! Tinha um acostamento grande e era plana, mas aos poucos notei que muitos motoristas estavam buzinando pra mim, tentando avisar da proibição. De repente apareceu a polícia. Que M….! Dei uma de “João sem braço” e eles só me deram um bronca. Depois fizeram com que eu pulasse uma cerca e seguisse para a estrada alternativa novamente.
Depois segui para as vilas de Flums, Sargan e Bad Ragaz. No caminho me perdi rapidamente, mas parei em um posto de gasolina, perguntei e no final das contas ganhei outro mapa. Segui exatamente o que me disseram no posto: Ir até Landquart e depois virar para a esquerda, sentido Schiers. Deu tudo certo. Passei por lugares bonitos, com diversas árvores e alguns rios.
Eu estava ciente de que subidas fortes viriam e quando vi uma placa, sentido Davos, apontando para uma montanha, não tive dúvidas e fui enfrentar o aclive. Pedalei 3km bem pesados (lembrando que não regulei direito as marchas e não conseguia usar a mais leve), parei para descansar e ao ver uma mulher, perguntei se esse era o caminho certo. Descobri que não era. Que M…! Voltei ao “pé” da montanha, olhei a maldita placa novamente e ela estava errada mesmo. Perdi preciosos minutos nessa brincadeira.
Soltei um alto e bom grito de raiva: Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!
Em Kloster-Dorf começaram as subidas. Primeiro um aclive bem forte, mas curto, que me levou para Kloster-Platz e depois uma subida com jeito de serra mesmo, com direito a rodovia e não mais ciclovia. Foram 7km montanha acima, com diversas paradas para descanso, pois as energias já estavam no fim.
Depois desse banquete, arrumei as minhas coisas, peguei a bike na garagem e comecei o pedal.
Quando estava na metade da montanha encontrei um cicloturista suíço chamado Oliver. Conversamos um pouco e nos despedimos. Logo comecei a visualizar cumes cobertos de neve e a emoção foi aumentando. Os últimos quilômetros foram os mais difíceis, mas proporcionalmente, os mais belos.
Por fim, depois de 2h, cheguei ao fim do passo Flüela, onde há um belíssimo lago e diversas montanhas nevadas. Show!
Ao continuar, pude apreciar as montanhas com cumes cobertos de neve e por alguns instantes esqueci todo o cansaço. Pena que foram só alguns instantes e logo voltei para a realidade da subida. Fazendo bastante esforço, consegui chegar na vila Trafoi. Não perdi tempo e logo estava instalado no camping que leva o mesmo nome da vila. Fiz questão de armar a barraca numa posição na qual eu pudesse ficar olhando para a gigantesca montanha coberta de neve.
Saldo do dia: 104 km de muito esforço.
Trafoi – Tirano – 13/07/2012 – 85 km
O que fazer? Sair pedalando e correr o risco de não tirar fotos ou esperar que o tempo melhore?
A subida era duríssima, mas maravilhosa. A estrada parecia uma serpente toda retorcida, espalhando-se de um lado a outro do penhasco, apegando-se nas menores oportunidades que o relevo oferecia para vencer o desnível.
Logo no início da descida, a adrenalina foi nas alturas. O primeiro motivo foi o visual fantástico daquelas montanhas e o segundo estava relacionado aos diversos nomes escritos na estrada. Ivan Basso, Cadel Evans, Purito Rodrigues, entre outros, ou seja, os melhores ciclistas do mundo estiveram ali. Foi no Giro d’Itália, que pude assistir pela televisão alguns meses antes. Novamente repito: Eu estava realizando um sonho.
Já na cidade destino, encontrei um senhor que me indicou um camping a 8 km do centro, na região metropolitana. Confesso que não foi tão fácil achar o tal camping, mas depois de algumas informações, consegui.
Armei acampamento, troquei a gancheira do bagageiro traseiro, que havia quebrado durante o pedal, tomei um banho e quando estava escrevendo o relato do dia dentro do aconchego da barraca, caiu um baita temporal. Nessa hora eu dei graças de ter levado uma capa de chuva (com menos de 1kg) para a barraca. Fica a dica.
Depois que o “dilúvio” passou, fui andar pelo camping e me surpreendi com a clientela. No local, que fica a beira do Lago di Lugano e ao lado do aeroporto, vi carros de luxo e barracas do tamanho de uma casa. Pelo jeito o pessoal passa todo o período de férias no camping.
Finalizei o dia me deliciando com pães e salame. Muiiito bom.
O bom é que quanto mais alto, melhor a paisagem. Comecei a ver montanhas cobertas de neve, algumas cachoeiras pequenas e as sonoras vacas suíças com seus sinos.
Parei, fechei os olhos e por alguns segundos esqueci de tudo e de todos. De olhos fechados, apenas sentia o vento frio que fazia naquela manhã e ouvia os sinos das inúmeras vacas. Ao voltar para a realidade do aclive, percebi que faria uma curva bem fechada, onde a estrada parece acabar, entraria em um túnel e continuaria subindo em direção ao topo.
Um pouco mais à frente registrei a minha passagem pelo passo com uma foto ao lado da placa que indica a altitude, mas não fiquei muito tempo parado, pois o frio estava aumentando. Apenas coloquei o anorak e comecei a descida.
Foram 18 km de pura adrenalina na descida. Curvas fechadas, vento contra, vento lateral, montanhas para todos os lados e muito frio. Passei pela cidade de Andermatt e pensei que a descida havia acabado, contudo tive a feliz surpresa de despencar por mais alguns quilômetros até a cidade de Wassen.
Com certeza meus olhos estavam brilhando.
Novamente fiz o ritual de colocar roupas mais quentes para enfrentar a descida, comi algumas bolachas e segui.
Declives e mais declives, velocidades acima de 40 km/h e muita empolgação, afinal eu tinha completado as duas montanhas previstas para o dia e agora estava descendo em direção a cidade de Interlaken. Descida que durou aproximadamente 30 km, sendo 20 de inclinação forte e grandes velocidades.
Depois de Thun, percorri mais 25 km planos até a cidade de Berna, capital do país, onde cheguei por volta das 12h. Fui seguindo algumas placas que indicavam um camping e em pouco tempo eu já estava com a minha casa ambulante montada.
Tudo aconteceu conforme o planejado, pois eu havia chego cedo em Berna e poderia conhecer melhor a capital. Deixei os meus pertences no camping e fui caminhando por uma “ciclovia” compartilhada que beirava o rio Aare. Este rio atravessa a cidade em forma de um “U” e é o melhor modo de um turista não ficar perdido.
Primeiro conheci a torre do relógio, depois fui para a catedral e por fim o museu de Einstein, mas infelizmente este último estava fechado para reforma. Fiquei um pouco decepcionado, pois o museu foi, entre os anos de 1903 e 1905, a casa do grande mestre da Física e dali surgiu a teoria da relatividade. Pedi para um senhor tirar um foto minha na frente da casa/museu e por fim perambulei pelas ruas e lojas.
Ao horas já ultrapassavam as 16 quando regressei ao aconchegante camping, tomei um banho, comi algo e fui descansar à beira do rio Aare.
Assim terminei o meu dia. Tive uma excelente estadia na capital Suíça. É uma cidade muito bela e organizada. Vale a pena conhecer.
No dia anterior, enquanto escrevia o diário, decide que meu próximo destino seria a cidade de Martigny, que dista 40 km de Montreux, cidade planejada para o meu pernoite. Aumentei essa quilometragem pensando na subida que iria enfrentar logo depois de Martigny, pois assim eu iria subir logo no começo do dia e com certeza estaria com mais energia.
Pois bem, meu dia começou cedo. Exatamente as 7:30 me despedi da capital Suíça e percorri 35 km, com pequenas subidas, até a cidade de Friburg. A paisagem não teve nada de especial, apenas plantações.
Um pouco antes de chegar ao meu destino do dia, parei para comer as deliciosas bolachas e tive a desagradável surpresa de encontrar o recheio totalmente derretido. “Maldito” calor!
Depois bastou pedalar mais alguns míseros quilômetros e pronto. Em Martigny fiquei aproximadamente uma hora procurando um hotel barato. Andei o centro inteiro e no fim descobri que existia um camping. Não tive dúvidas ao escolher e rapidamente cheguei para mais um acampamento.
Tomei um banho, comprei pães, salame e frutas, escrevi o relato e dormi.
Andei, entrei em diversas lojas e apreciei bastante o centro. Confesso que tive uma boa impressão da cidade. Achei bem aconchegante e simpática.
Depois fui para o outro teleférico e mesmo de longe, fiquei deslumbrado com a vista. Olhava para frente e via diversas montanhas com neve, aos meus pés estava a charmosa cidade de Chamonix e atrás existiam outras montanhas cobertas, pelas vegetação, e um lago. Impressionante!
Enquanto esperava, decidi ir até a praça central e conferir as estátuas de Jacques Balmat abraçando Horace Bénedict de Saussure e apontando que aponta diretamente para o cume do Mont Blanc.
Aqui vale ler um pouco da história:
Novamente eu podia olhar a charmosa Chamonix do alto, mas meus olhos queriam ver a deslumbrante montanha. Diferentemente do dia anterior, no qual eu olhava a montanha de longe, agora eu fazia parte da mesma. Tirei muitas fotos, filmei e apreciei ao máximo aquele momento, mas ainda estava faltando ver o Mont Blanc. E para realizar o grande sonho, tive que esperar mais um pouco até o vento diminuir e o teleférico principal funcionar.
Satisfeito, desci novamente até a cidade de Chamonix, passei em um supermercado e por fim, voltei ao camping por volta das 10h. Comi, arrumei minhas tralhas e sai às 11h e 17 min.
Sem fazer muito esforço eu avancei bastante e quando vi já estava na cidade de Ugine, onde virei para a esquerda e segui por uma marginal, com 10km planos, até Albertville.
Nos despedimos, trocamos e-mail e seguimos nossos caminhos.