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PBP 2015 – Relato de Cesar Dosso

Postado em 25 agosto 2015 por awulll

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Paris-Brest-Paris 2015… o relato de um randonneur iniciante.

Poucas coisas na vida emocionam tanto quanto perceber que você trilhou o caminho certo em qualquer situação na vida. “Realizar um sonho acalentado e batalhado, viver uma experiência totalmente nova e positiva”, assim resumo o que foi pra mim chegar no final do PBP2015.
Quando lá no passado eu decidi abraçar o ciclismo como esporte, não tinha noção que meu coração seria tão fortemente arrebatado pelo Randonnèe. Agora tente se projetar através do meu olhar para entender o que foi vivenciar esse evento tão especial do nosso calendário.
Sempre tive espírito combativo nos esportes, mas a empatia com a tristeza dos derrotados me impedia de comemorar as vitórias de maneira plena, fazendo que me sentisse parcialmente feliz em competições. No Randonnèe, por outro lado, o desafio se dá entre nós mesmos e nossos limites.
Não cabe aqui explicações sobre o que é ser um Randonneur, então devido ao que disse anteriormente, essa modalidade me caiu como uma luva. Fiz muitas amizades verdadeiras, daquelas que anteriormente poderia contar em poucos dedos. Rever essas pessoas em terras francesas foi o primeiro grande feito do PBP. Quando, inclusive em sonhos, eu poderia imaginar rever a turma num outro continente para pedalar e se divertir? Devido a isso, fomos acometidos de um rompante de patriotismo como forma de externar a todo o mundo que não somos apenas o país do futebol, mas também uma grande potencia do ciclismo de longa distancia. Sim, digo isso sem medo de ser exagerado, pois somos guerreiros e sobreviventes no transito caótico que vivemos aqui. Falando nisso, a França é um pais maravilhoso para se pedalar, não a defendo como o melhor lugar do mundo. Há problemas, porém comparar com o Brasil seria vergonhoso e desnecessário.
Alguns sabem que estudei um pouco do idioma francês para encarar o PBP, decisão essa que me rendeu uma experiência fora dos padrões, mais turística, interagi com a população numa via de mão dupla. Descobri que o estereótipo que algumas pessoas impõem aos franceses é ridículo e infundado, pois são calorosos, hospitaleiros e muito comunicativos. O pais como um todo me remete às cidadezinhas do interior onde todo mundo se conhece e cumprimenta. As pessoas gostam de onde nasceram e costumam enfeitar suas casas com flores e muito capricho. Pergunte a um francês como ele está, verá um sorriso brilhar no seu rosto e prepare-se para uma boa conversa. A propósito, nós brasileiros somos muito queridos por eles, com o tempo percebi que a maior parte do mundo pensa o mesmo. O motivo é simples: nós brasileiros nos compadecemos do sofrimento alheio, acima da média, também somos simpáticos e comunicativos. Desde os primeiros contatos com o evento, vi a grandiosidade e a importância que as pessoas dão aos ciclistas. Visitar o Velódromo de Saint-Quentin , sede de mundiais de ciclismo de pista, foi como visitar a Meca do nosso esporte. Assim como foi o inicio da prova, com trechos lindíssimos utilizados no Tour de France. A maioria se emocionou com isso, estávamos em êxtase!
As famílias falavam frases de incentivo, as crianças faziam fila para tocar nossas mãos…éramos cumprimentados por pessoas de todas as idades e em praticamente qualquer hora do dia, durante TODO o evento. Penso se algum dia poderemos proporcionar algo à altura disso para alguém. Foi difícil não se render as lágrimas em diversos pontos da prova. Multidões de franceses, para um mundo de ciclistas… pois não tinha noção da diversidade de nações e de culturas que iriam pedalar lado-a-lado em comunhão ao esporte.
Perdi a conta de pessoas que conheci e conversas que tive, mas com um espírito único de randonneur.
Mas se você considerar apenas os mais de 1230km do percurso não terá noção da dureza de uma prova assim, pois a altimetria varia muito, não recordo de ter pedalado no plano. Os PAs e PCs sempre cheios de gente se mostraram um desafio à parte, pois as filas e alguns problemas estruturais acarretavam perda de horas de sono. Tempo esse que cobrou um alto preço a muitos randonneurs, no meu caso forçando a parar para pequenos cochilos aleatórios na estrada, para manter o mínimo de condições de atenção. Com o decorrer do percurso se encontravam muitos ciclistas dormindo na beira das rodovias, praças ou em qualquer lugar. Pessoalmente, enfrentei altos e baixos, vomitei num ponto do percurso, fui picado por uma vespa ou algo assim na mão esquerda, o que me impediu de usar a mesma por alguns quilômetros, quebrei raio da roda dianteira ao cruzar uma linha férrea em alta velocidade, tive um desconforto na coxa esquerda devido a sprints morro acima para espantar a sonolência. Mas se fosse definir os grandes vilões das longas distâncias, diria que são os dois pontos mais básicos à vida como um todo: Alimentação e Sono. Sem eles não existe desempenho, muito menos qualidade (diversão) durante a pedalada. Quem pecou nesses dois itens, teve problemas. Mas na contramão dos PAs e PCs lotados, atendendo as preces dos desnutridos e sonolentos, varias famílias abriram as portas de suas casas para nos receber, num gesto de carinho e hospitalidade impar! Pequenas cidadezinhas nos atenderam com restaurantes, cafés e muita festa. Em especial, cabe ressaltar o PC Villaines-la-Juhel… onde a cidade organizou uma grande festa que emocionou a todos.
Pouco a pouco as mensagens de incentivo dos brasileiros que acompanhavam foram chegando e uma energia poderosamente positiva nos iluminou na ultima noite até Dreux (ultimo PC), brincadeiras, alto astral e uma chuva para lavar a alma perto de Paris nos proporcionou uma chegada inesquecível e cheia de emoção… nossos anjos randoneiros que ficaram no caminho estavam à nossa espera na chegada. Carimbamos os passaportes e brindamos a vida e ao objetivo alcançado, pensando que 2019 é logo ali.
Finalmente, gostaria de agradecer as muitas pessoas que tornaram isso tudo possível:
- Minha Família, em especial a minha esposa que cuidou das nossas filhas enquanto me mandava carinho e força;
- Aos meus amigos, sem os quais eu não teria força, preparo e animo nem para pedalar 10km;
- Aos mecânicos, professores e todos que me proporcionaram a chance de completar a prova com qualidade;
- A Deus, por nos conduzir com segurança e nos iluminar com boas vibrações;
- A Poderosa, minha amada bicicleta, que me levou a realizar um grande feito, espero que o primeiro de muitos;
- Ao povo francês, por ser o povo francês. Acho que se um dia tivermos metade da educação que vocês tem, seremos um país muito mais próspero;
- E finalmente a todos os amigos brasileiros que estiveram no PBP, pedalando ou não comigo.

Parabéns Audax Club Parisien pelo grande evento!

Um grande abraço a todos

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