Minha preparação para o PBP 2011 começou em 2007 quando assisti a apresentação de Luiz e Erich. Meu objetivo, desde então, tornou-se participar do Paris Brest Paris.
A classificação foi “tranquila”, as provas das quais participei foram desafiadoras, no entanto pude testar minha resistência e, principalmente, minha persistência. Não posso deixar de mencionar a participação de minha grande amiga e companheira de provas, Gabriela Martin. Ela fez muita falta durante o PBP, pois em TODAS as provas das quais participei pude contar com o seu apoio. Decidimos realizar toda a série em Santa Cruz do Sul, os 200 km pedalamos no sábado e os 300 km no domingo (pois assim não precisaríamos nos deslocar a outras cidades para seguir com a série). Conseguimos. Por motivos de força maior, os 400 km tive que pedalar a prova da organização. Gabriela participou das duas provas, da oficial e a da organização, tudo isso para não me deixar sozinha. Muito Obrigada! Já a prova dos 600 km mostrou-se uma prova bem difícil, devido à altimetria, porém terminamos bem quando comparado com a série de 2009. Posso dizer que evoluímos, pois conseguimos descansar 1 hora e ainda chegamos cerca de 30 minutos antes do termino da prova.
Com todos os requisitos preenchidos, resolvi que estava na hora de fazer minha inscrição. Porém, antes tive que organizar-me, ver como faria para chegar a Paris, como me deslocar, em que hotel e com quem iria ficar. Estava com bastante receio, uma vez que seria minha primeira viagem internacional e sozinha. Conversei com Erich, e optei pelo hotel sugerido por ele. Ficava em uma ótima localização, perto do centro de Paris o que nos possibilitou conhecer os arredores, inclusive sobre duas rodas. \o/
Lazary também ficou no mesmo hotel. Agradeço pela ótima companhia de ambos, juntamente com Ludmila e Elvira, suas respectivas companheiras (que ainda forneceram-nos apoio em Loudéac na ida e na volta).
Realizei a inscrição uma semana antes do encerramento. Não sei como, mas errei e acabei por inscrever-me nas 80 horas. Havia queimado meus “coringas” antes mesmo da prova começar. Tentei reverter a situação, mandei e-mail para a organização, mas nada poderia ser feito, depois de gerado o número da placa. A única alternativa era pedalar a prova em 80 horas. Fiquei chateada com minha falta de atenção, mas estava decidida a não deixar isso impedir minha participação na prova, fui confiante e motivada a completá-la nas 90 horas.
No dia da vistoria encontrei muitos brasileiros, cuja grande maioria não conhecia pessoalmente, porém o clima era de festa. Foi uma lastima não sair a foto oficial de nosso país com todos os participantes brasileiros, quem sabe em 2015. Conheci o Tim, de Brasília, combinamos de largar juntos no dia seguinte.
Dia 21 de agosto, chegou o dia que por várias vezes idealizei. Segui sozinha de Paris até St-Quenti-en-Yvelines, minha largada estava marcada para as 16 horas. Cheguei ao ginásio por volta do meio-dia. Logo encontrei o Tim, a bandeira de nosso país atrás da bicicleta era inconfundível. Almoçamos, o clima estava descontraído e extremamente agradável. Acabamos no último grupo e por isso ficamos muito tempo sob o sol quente, esperando a largada.
Na largada estavam Elvira e Ludmila tirando fotos e dando aquele apoio. Foi o momento mais emocionante da prova, tive que me conter para não chorar. Fomos tratados como heróis. Como Tim tem um ritmo forte, logo o perdi de vista. A estratégia era não forçar demasiadamente no princípio. Assim, tentava acompanhar os grupos onde havia mulheres e, acima de tudo, seguissem num ritmo parecido com o meu. Entrei em um grupo formado por uma mulher e quatro homens (todos franceses), pedalei com eles uns 20 km, mas começaram as subidas e acabei ficando para trás, portanto acabei pedalando sozinha por um bom tempo. Cheguei a Mortegne-au-Perche bem cansada, uns quilômetros antes de chegar encontrei com o Della. Era bom encontrar um brasileiro no meio de tantos desconhecidos. No ponto de apoio comprei alguma coisa para comer, encontrei com Calvete e com César. Não fiquei muito tempo parada, pois não poderia perder tempo.
Continuei no meu ritmo. Num certo ponto estava distraída, quando passa o João Saboia, ele grita meu nome. Esse apoio moral, transmitido de um para o outro, é de suma importância em provas de longa distância. Cerca de 10 km antes de chegar a Villaines-la-Juhel (primeiro PC), encontrei o Rafael Castro. Nós paramos em um barzinho para tomar uma Coca-Cola e comer um sanduíche. Saímos juntos, mas meu ritmo era diferente do dele.
Por desatenção, acabei passando pelo primeiro PC sem carimbar meu passaporte, e quando me dei conta, eu já havia pedalado na base de 12 km. Indignada comigo mesma, dei a volta para carimbá-lo. Quando cheguei ao PC, o senhor da organização avisou-me que eu estava atrasada, mas mesmo assim carimbou meu passaporte. Senti-me extremamente chateada com minha falha. Neste PC encontrei o Lazary e o Erich, e cheguei a cogitar minha desistência com o Erich. No entanto, comi um lanche e decidi que não seria a brasileira a pedalar a menor distância no PBP.
Continuei pedalando em um ritmo mais forte, para compensar o tempo perdido. Tentava acompanhar os grupos e pegar carona com alguns pelotões, não funcionava muito. Foi então que encontrei um casal e mais uma mulher, que decidiram montar um grupo e me convidaram, claro que aceitei. Tinha que chegar rápido ao próximo ponto de controle, pois precisava estar dentro do tempo. No entanto, acredito que tenhamos pedalado aproximadamente 40 km, quando o casal parou para comer algo, mas eu e Mariza continuamos. Ela perguntou de onde eu era e se estava pedalando sozinha, respondi as perguntas, então ela me questiona quanto ao fato de pedalar sozinha, disse que estava tranqüila, mas que mesmo assim não era uma tarefa muito fácil. Ela disse que tinha um grupo e que eles haviam parado para descansar um pouco, mas se eu quisesse poderia pedalar com eles. Adorei o convite e topei.
Como tinha esperança de chegar a tempo no próximo PC, deixei Mariza para trás e continuei em um ritmo mais forte, sem chegar a conhecer seus amigos. Cheguei ao segundo PC atrasada, mas como marcaram meu passaporte segui na prova, iria continuar até que alguém da organização me barrasse. Neste PC encontrei o Eduardo Green e a filha do Della, que estavam apoiando o pessoal de Santa Catarina, e o Cezar. Conversei um pouco com eles, mas logo segui em direção a Brest.
Passado algum tempo o Cezar passa por mim, mas estava sem condições de acompanhá-lo, pois havia me desgastado bastante para chegar ao PC anterior. Enquanto pedalava o que me preocupava era saber se em Fougères iriam marcar meu passaporte. Afinal seria o terceiro PC ao qual chegaria atrasada. Neste momento surge Mariza, com Daniel e Bernard, ela fez sinal para seguir com eles, era maravilhoso ver o ritmo que eles pedalavam e era melhor ainda conseguir acompanha-los.
Eles são veteranos no PBP. Daniel é um senhor de 74 anos, que concluiu o sétimo PBP. Mariza e Bernard tinham respectivamente 32 e 34 anos, e concluíram o quarto PBP, eles fazem parte de um clube de ciclismo de Paris. Dormimos em Loudéac, lá tomei um banho e dei uma renovada, acredito que estava meio catatônica, pois acabei deixando meu capacete no banheiro, quando voltei para pegá-lo a voluntária da organização me olhou com uma cara de incrédula. Descansei pouco e aconteceu algo que não havia enfrentado nas provas que participei aqui no Brasil, estava dormindo em cima da bicicleta. Daniel ficou preocupado, eu mais ainda. Pedalei com eles até um pouco antes de chegar a Brest, mas com a chegada das subidas novamente acabei ficando para trás.
Em Brest, fiz uma parada rápida, pedalei sozinha até Carhaix-Plouguer, neste PC estavam Calvete, André e Guilherme, conversei um pouco, disse que meu objetivo naquele momento era completar a prova em 90horas, tinha esperança de que se chegasse dentro dessa meta, a organização iria homologar minha prova. Encontrei um casal de franceses, com um ritmo parecido com o meu, a senhora disse que podia acompanhá-los. No entanto, alguns quilômetros depois encontrei Mariza, Daniel e Bernard, e optei por seguir com eles.
Pedalei um pequeno espaço de tempo com um alemão, mas tínhamos estratégias diferentes, ele iria dormir em Quedillac e eu em Loudéac, segui com o trio Fantástico, neste momento estava muito bem na prova e confiante. Como na ida, na volta também dormimos em Loudéac. Desta vez consegui descansar mais tempo em torno de 3 horas, o suficiente para continuar sem dormir em cima da bicicleta.
Após o descanso o dia seguiu tranqüilo, era maravilhoso pedalar com os franceses, pois eles sabiam onde parar para tomar um belo café e comer umas panquecas deliciosas. De Fougères até Villaines-la-Juhel novamente as subidas e mais subidas, as 80 horas ficando mais escassas. Como diria Pereira (Huli huli): “Na vida há mais subidas que decidas”. Senti na pele seu ditado. Foi em Villaines-la-Juhel que tomei a decisão mais difícil, a prova iria terminar naquele PC, estava cansada, desmotivada e não aguentava mais, havia chegado ao meu limite, ao menos, era o que eu achava. Perguntei à organização onde havia uma estação de trem para voltar a St-Quentin-en-Yvelines, para minha surpresa não havia. Daniel falou que eu podia seguir pedalando até lá, mas como minha inscrição era para as 80 horas, minha prova não seria homologado, o que foi confirmando por uma voluntária da organização, nada poderia ser feito para contornar meu erro. Minha única opção era seguir pedalando. Encontrei um sueco, que vendo minha apatia, disse para não olhar para as subidas e ir contando até 10 em todas as línguas que conhecesse, era o que ele fazia, não deu muito certo comigo, talvez porque eu não conhecesse tantas línguas e naquele momento qualquer subida era enorme.
Cheguei ao PC de Mortagne-au-Perche, havia passado da meia noite, o tempo estava se esgotando, estava desmotivada e irritada. Restavam apenas 7 minutos para pedalar 140 km, como já passava da meia noite, não iria encontrar um trem de volta. Revolvi esperar o Erich e Lazary e seguir com eles. Dormi na mesa do ginásio (naquela hora minhas exigências quanto a “camas” não eram específicas), foi então que apareceu o pessoal do apoio de Santa Catarina. Pereira, Eduardo e Rafael Dias, oferecendo carona, aceitei na hora.
Ganhei carona até Plaisir. Dormi. No dia seguinte, seguimos eu, Rafael e Eduardo para recebemos os brasileiros na chegada. Eduardo foi à frente, como estava cansada eu e Rafael pedalamos mais tranquilamente. Pedalamos com alguns ciclistas que chegavam naquele momento ao ginásio. Eram ciclistas com, literalmente, sangue na roupa, com curativos nos braços e pernas, de arrepiar. A garra e determinação para conquistar o objetivo, era surpreendente. Vimos a chegada do Richard, Guilherme, Simone e Alexsander. Conversei um pouco com o pessoal e peguei o trem de volta a Paris.
Bom, quero aproveitar este relato e agradecer a todos que contribuíram com meu sonho, em primeiro lugar a Deus. A minha família, desculpa pela aflição de não mandar notícias, a Gabriela, minha amiga/irmã, com você toda prova foi mais fácil. A nossa musa inspiradora, Rosane Gomes. Ao Beto, meu amigão, que me ajudou muito nos meses que antecederam a prova, teve a paciência de me ensinar a montar e desmontar a bicicleta por várias vezes. Além, é claro, de uns passeios punks, como diria o Bughera. Muito Obrigada! Ao Faccin, mesmo brigando depois da prova comigo. Acredito que se essa modalidade chegou ao patamar que se encontra hoje, devemos muito a você. Ao Grupo Santa Ciclismo, do qual faço parte, e onde sempre encontrei muito apoio. Ao grupo Várzea Bike, pedalar o fleche foi sensacional. Ao Jorge Martins, pela sua disposição em nos auxiliar antes da prova com dicas valiosas. Ao pessoal de Santa Catarina, pela carona após a desistência da prova. Não estava com a mínima vontade de pedalar os 140 km restantes. Ao Rafael Dias, por me acompanhar até o ginásio. Ao Tim, um cara super legal, que tive a oportunidade de conhecer. Agradeço muito pela força antes da prova. Sou sua fã. Ao Edson, pedalar mais de 900 km com o tornozelo inchado não é fácil, és realmente uma pessoa muito focada e determinada. Ao Calvete, pela persistência. Minha grande admiração a Simone, primeira mulher brasileira a completar o PBP. E por fim, mas talvez os mais importantes. Lazary, por sua conquista triunfante, espelho-me em ti, e Erich, que mesmo com uma bicicleta diferente completou este grande desafio. Ludmila e Elvira pela ótima companhia durante toda a viagem. Parabéns a todos os brasileiros que participaram do PBP, principalmente aos que concluíram com sucesso essa aventura, são ícones para os participantes das provas do Brasil, vocês fizeram história. Aos que não concluíram também, tivemos a coragem de tentar.
outubro 31st, 2011 em 8:06
Excelente Relato Lidiane!!!! A todos os brasileiros que foram participar deste PBP e das edições anteriores, são verdadeiros heróis que um dia serão reconhecidos!!! VIVA O CICLISMO!!!
novembro 17th, 2011 em 21:58
Muito massa o relato!
E daqui 4 anos vai ser o de mais uma brasileira a terminar um PBP!